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setembro 21, 2016

Mudança tem nome?

por Marcos Naime Pontes

Me alimento de histórias. Produzo histórias.

Um dia ouvi num congresso há muito tempo a história de que os primeiros pesquisadores médicos numa reserva indígena tiveram problemas para identificar os habitantes. Ao longo do tempo, as pessoas trocavam de nome. Para cada fase ou mudança do lugar que cada indivíduo ocupava, ele recebia e dava a si mesmo um nome diferente.

Mais recentemente, numa mesa bem especial, Paula Ayub nos alimentou de histórias e ouviu as nossas. A que contamos aqui precisava de um relato.

José Felipe nasceu assim, com nome bonito e muitas diferenças. Diferenças que são vistas por Paula. E por ela também ter nascido diferente, tem o dom de encontrar uma via de acesso por entre as diferenças para deixar florescer e facilitar os desenvolvimentos atropelados.

Psicóloga, terapeuta de família e com um olhar praticamente único sobre seres humanos que outros talvez nem vissem, Paula é uma das profissionais que vibra com cada passo dado por “suas” crianças.

Como os pares se acham na multidão, Paula tem uma das melhores redes profissionais e consegue usar os dons dessa rede para encontrar soluções para as crianças “suas”, “nossas” e “deles”.

Foi assim com José Felipe, que vinha se desenvolvendo fortemente contra as formas que a natureza lhe deu. Hipotonias, desartrias, sem fala, controle esfincteriano em treinamento… Envolto por uma rede de profissionais, todos a postos para trabalhar a construção de um afeto e pertencimento a grupos, a escola e os auxiliares faziam com que ele crescesse cada vez melhor.

Porém, Paula também sabe que aqueles que recebem histórias e cuidados um dia poderão produzi-las. Por isso, foi em busca das histórias de José.

Sussurrou-nos que havia pensado em um modelo ideal. Quem poderia suportar receber as histórias de José? Onde ele se veria capaz? Com crianças mais novas e ávidas de conhecer o mundo? Em que lugar? Que pessoas teriam esse mesmo olhar?

Lembrando-se de sua rede, encontrou a escola Ponto de Partida, conhecida por suas possibilidades e portas absolutamente abertas para as diferenças. Uma escola de educação infantil com cenário apropriado para o exercício de José Felipe e de suas competências. Um espaço para ajudar e não mais ser apenas ajudado; um espaço para ser visto e ouvido.


Pintura de Marcos Naime Pontes

Além de sua escola regular, José passou a frequentar a Ponto de Partida toda sexta-feira, iniciando um novo caminho dentro do longo que já trilhava. E sem mais nem por que, José, por acaso ou à moda dos índios, teve o nome alterado e começou a ser chamado por todos, incluindo Paula, de Luís.

Paula não consegue explicar a razão. E nem a escola. Mas foi assim que as crianças o reconheceram. E mais: também à moda dos índios, a mudança de nome veio com uma mudança de lugar no mundo, sendo reconhecido de maneira mais ampla por todos.

Agora é ele quem dá o tempo com o seu canto nas aulas de música, acompanhado pelos novos colegas. E isso é apenas a ponta do iceberg que se ergue diante de nossos olhos para o mundo que José/Luís quer abraçar.

As mudanças foram tantas que Paula e sua equipe foram chamados na escola regular de José, uma escola que apoia, valoriza e qualifica as aquisições do jovem rapaz: “O que está acontecendo com ele? Parece nos dizer algo que não entendemos. Quer nos mostrar algo…”.

Paula revelou detalhes da nova experiência de José, com crianças menores, onde é o lider do time e escolhe livros de história pelo título que lhe pedem, onde vai sozinho e certeiro em busca do que quer.

“Estávamos, eu e a família, fazendo segredo para vermos se haveria alguma mudança”, diz Paula a todos.

E que mudança!

José Felipe está contando para todos seu novo lugar no mundo e pede que avancem com ele nas mudanças.

Suas vitórias para alcançar o banheiro comunitário, se equilibrar na patente, pedir ajuda para lidar com suas roupas através de movimentos de apreensão e puxões são compreendidos e acompanhados pela equipe. José desenvolveu o controle esfincteriano em um dia!

Felicidade e busca em falar. Usando um equipamento especialmente adaptado a ele, a procura pela comunicação se desenvolve.

E mais, muito mais se abriu.

José mudou para o lugar Luís e mudou seu mundo. A toda gente de José, Luís se fez sentir e agora muda em torno das novidades apresentadas.

Paula Ayub é psicóloga, terapeuta de família, fundadora e mantenedora do Centro de Convivência Movimento.

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